A resistência dos camelôs da Uruguaiana

Por Maria dos Camelôs e Hertz Leal, do Movimento Unido dos Camelôs (MUCA) em Rede Universidade Nômade

 

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A Guarda Municipal agiu com violência nesta sexta-feira, 4 de janeiro, contra os camelôs que trabalham nas imediações do Camelódromo da Uruguaiana, no Centro do Rio de Janeiro. Mais uma vez, repete-se a rotina de violência por parte da prefeitura, em meio a denúncias de recebimento de propina para permitir que os camelôs trabalhem. Menos frequente tem sido a resposta, mas desta vez a população revoltada reagiu jogando pedras e virando um carro da Guarda.

De noite, o Movimento Unido dos Camelôs (MUCA) foi até a 5ª DP, com uma advogada do Centro de Assessoria Popular Mariana Criola. Lá, encontrou alguns advogados do Instituto de Defesa dos Direitos Humanos (IDDH), que estavam atendendo o camelô José Ricardo, de 24 anos, acusado de agressão. Sua fiança foi estipulada em um mil reais. Tivemos que ir à Uruguaiana e fazer uma “vaquinha”, com apoiadores e outros camelôs, para retirá-lo da cadeia. Essa é a política tradicional adotada pelo poder municipal  para resolver os problemas enfrentados pela população pobre: mais polícia, mais violência.

O prefeito Eduardo Paes começou o seu mandato com a política de “choque de ordem”. Desde então, aumentou os efetivos de guardas municipais e sancionou uma lei autorizando-lhes o uso de armas menos letais. A partir das denúncias dos camelôs e da população em situação de rua, contra os abusos da política de choque de ordem e a violência da Guarda Municipal, o promotor Rogério Pacheco mediou a realização de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) para regular a situação, mas o prefeito não o cumpriu. Foi então promovida uma Ação Civil Pública requerendo que a Guarda se abstenha de fiscalizar e reprimir o comércio ambulante, porque constitui desvio de sua função, bem como requerendo a proibição do uso de armas menos letais, como o taser (arma de choque) e o spray de pimenta, pelos guardas municipais. Na segunda instância da justiça estadual, obtivemos uma medida liminar suspendendo o uso dessas armas.

Entendemos que a política para os camelôs, a população em situação de rua e os sem tetos, dentre outros grupos vulneráveis, não deve ser mais tratá-los como caso de polícia, sempre clamando por mais punição e mais perseguição. A política correta deve ser prezar por uma maior participação popular, por mais democracia e mais diálogo com os diversos grupos. Enfim, mais respeito a vida e a dignidade humana. Parece que os governantes não lembram desta parte da Constituição. Então é preciso lembrá-los e, para isso, não vamos sair das ruas.

O MUCA convida todos que são contra a fiscalização do comércio ambulante pela Guarda Municipal, e contra a violência contra os camelôs, na próxima sexta-feira, 31 de janeiro, a partir das 18h, na Uruguaiana, para um Ato de desagravo, com música, exibição de vídeos, conversas, discursos e propostas para continuar a campanha: “Fora Guarda Municipal da Fiscalização do Comércio Ambulante”.

A PROVIDÊNCIA É A ORGANIZAÇÃO PARA AS MANIFESTAÇÕES NAS RUAS

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O que pretende o prefeito Eduardo Paes? Qual será o próximo golpe contra as comunidades ameaçadas pelas remoções?

Ao ver a forma desumana que a Polícia Militar e a Prefeitura do Rio de Janeiro removem as famílias de suas moradias, derrubando as casas com os pertences familiares, na favela do Metrô-Mangueira neste início de janeiro de 2014, preparando a cidade para a Copa de 2014, lembramos das remoções de dezembro de 2010, na Av. das Américas, na Vila Harmonia, na Vila Recreio II onde o choque de ordem, do prefeito, derrubou as moradias e o comércio sem aviso prévio e sem negociações para fazer a Transoeste e para a valorização imobiliária dos condomínios, pois muitas áreas onde as moradias foram demolidas não foram utilizadas.

Após as Jornadas de Junho o prefeito resolve conversar e diz que não haverá mais remoções, isto foi em setembro do ano passado, ele disse que a Vila Autódromo não seria removida, seria reassentado apenas quem desejasse ir para o Parque Carioca do Minha Casa, Minha Vida, mas não deu importância ao Plano Popular de Urbanização da Vila Autódromo feito com apoio de duas universidades públicas, que ganhou um prêmio internacional do concurso Deutsche Bank Urban Age Award (DBUAA). Na prática não cumpriu o que disse, fazendo uma dura negociação, continuando a forçar os moradores a aceitarem indenizações ou irem para o Parque Carioca, ainda organizou uma falsa manifestação dos que querem o reassentamento.

No Morro da Providência a Defensoria Pública conseguiu uma liminar que impede às remoções, esta é a área do Porto Maravilha, onde a prefeitura lança a nova modalidade de privatização dos espaços públicos, a revitalização pela operação urbana consorciada, mas vamos nos ater as negociações do Eduardo Paes com as comunidades ameaçadas de remoção. Tendo em vista a paralisação do projeto Morar Carioca no Morro da Providência, que prevê a inauguração do teleférico e do plano inclinado, o prefeito chama a comissão de moradores, a Defensoria Pública e o coletivo técnico de apoio para uma reunião em que anuncia que não haverá mais remoções, que o plano inclinado poderá ser menor, mais estreito passando pelo meio das escadarias , não necessitando remover as moradias naquele local e que só precisaria remover 70 moradias em área de risco, que a GeoRio apresentou um laudo indicando estas moradias, o coletivo de apoio técnico elaborou um contra laudo e quer analisar os casos numa reunião com os técnicos da prefeitura.

A comissão de moradores precisa discutir os projetos que ficaram de ser apresentados no dia 13/01/2014, mas há uma desconfiança, alguns defensores pediram os termos do acordo da reunião por escrito, estão preocupados com alguma possível mudança no decorrer das negociações e aconselham a consolidar logo as vitórias. O Eduardo Paes chegou a declarar que “se vocês assinarem se responsabilizando, nem a área de risco eu retiro”, o que entendemos como um comportamento irregular, pois não existe a possibilidade de alguém se responsabilizar pelas competências do executivo. Confirmando-se as expectativas a Prefeitura mais uma vez não apresentou os projetos, parece que apresentou uma ata da reunião com os compromissos pactuados.

Queremos a realização do que está previsto na Lei do Estatuto das Cidades, o direito à participação democrática, as comunidades precisam demonstrar suas ponderações e suas considerações técnicas. Vamos cobrar a responsabilidade do executivo municipal na realização das obras necessárias para diminuir os riscos e oferecer moradias adequadas. Queremos a discussão dos projetos de urbanização com as comunidades afetadas, com a possibilidade de modificação e reajustes com quem conhece o local e com quem receberá ou sofrerá as transformações urbanísticas. A liminar que suspende o projeto Morar Carioca no Morro da Providência é baseada na falta de realização de audiências públicas, no desconhecimento do projeto pela comunidade, não aceitaremos audiências como foi a da concessão do Maracanã em que a maioria se manifestou contra a privatização, foi sugerido um plebiscito, mas o governo resolveu privatizar mesmo assim.

Não sabemos até onde vai a vontade do governo municipal para ouvir e negociar com as comunidades, quais projetos que estão sendo financiados pelo governo federal e quais projetos de melhoria da vida das pessoas, que serão realizados, o que será abandonado nos escombros como na favela do Metrô-Mangueira e na Estradinha. Sabemos que o Eduardo Paes pretende liberar espaços para os projetos da Copa do Mundo, que no Morro da Providência quer terminar o Morar Carioca e implantar o Porto Maravilha, sabemos que a forma de atuação preferida é através da truculência e do desrespeito aos interesses dos pobres, fazendo negociações individuais e estimulando a divisão, jogando moradores que aceitam sair contra moradores que querem ficar, como na comunidade da Indiana, em que os servidores municipais presenciaram agressão de uma moradora militante da comissão dos moradores que desejam ficar, além de não repreender a agressora continuaram a atividade como nada de grave houvesse ocorrido.

Quando o prefeito fala sobre os interesses dos investidores, das empreiteiras, dos bancos e dos empresários dos transportes apresenta o discurso do respeito aos contratos, que a cidade dos negócios precisa de um ambiente de confiança, mas também diz que respeitar e investir nos direitos da maioria da população é ser populista.

Os governos estão dominados pelos financiadores das campanhas eleitorais e pelos bancos que investem na dívida pública. A maioria da população tem que se organizar nas comunidades para resistir à especulação imobiliária, à remoção branca, participando das grandes manifestações como nas jornadas de junho, que possibilitaram algumas negociações com a Prefeitura. Por isto o “Não Vai Ter Copa” é o fantasma que persegue os governantes e estimula as negociações pelo direito à moradia, ao saneamento, à educação, à saúde e ao transporte público de qualidade.

Hertz Leal